Apesar da cultura da imagem, os livros
ainda são a melhor forma de estimular as crianças a pensar
Há muitos séculos, o número
de livros e leitores assim como o acesso à leitura por parte
de maiores camadas da população não deixou
de crescer. Entretanto, ao constatar os efeitos devastadores da cultura
da imagem, alguns concluem que os leitores de hoje são piores que
os de ontem, afirmação muito discutível. As coisas
mudaram: muitos esquemas imaginativos foram superados pelo cinema e pela
televisão. Já não servem os velhos romances de letra
pequena e papel barato. Nunca voltarão as tardes de verão
com a única companhia dos livros do Sítio do Pica-Pau Amarelo.
Os modernos livros ilustrados são outra maneira de introdução
à leitura.
A quem se lamenta do pouco que seus filhos lêem e da nefasta influência
da televisão, basta lembrar uma tirinha de Calvin e Haroldo, o
menino de seis anos e seu tigre de pelúcia criados por Bill Watterson.
Nos quatro primeiros quadros, vê-se uma luta violentíssima
em uma revista de aventuras, que termina com o herói metralhado
e dizendo: senti-me como se minha coluna tivesse se partido em pedaços.
Os quadrinhos seguintes mostram um Calvin angustiado, que deixa a leitura
da revista e liga a televisão. Chega sua mãe que, amavelmente,
desliga o aparelho enquanto diz: Não, porque há muita
violência na televisão. Por que você não vai
ler alguma coisa?
A expressão livros ilustrados engloba produtos distintos
entre os quais há uma forte osmose: contos ilustrados, em que o
texto tem praticamente autonomia em relação às imagens;
e os quadrinhos, em que texto e ilustração são inseparáveis.
No século 19, passou-se das ilustrações puramente
decorativas àquelas em que aparecia uma imagem na capa e acompanhavam
cenas concretas da narração. Logo surgiram relatos com imagens
ligadas ao texto de modo indissolúvel: os contos ilustrados.
Esse novo tipo de livro ilustrado caracteriza-se por usar gravuras grandes,
que, com freqüência, ocupam páginas inteiras, simples
ou duplas. As ilustrações não são um complemento
do texto, mas sim o próprio texto. Seu conjunto quer ser narrativo
e ter o mesmo formato seqüencial do livro. Pode usar recursos gráficos
dos quadrinhos, mas não têm o mesmo dinamismo nem utiliza
o mesmo tipo de verossimilhança. Pretende ir mais longe que os
tradicionais contos ilustrados. Aproveitando o impacto de gravuras grandes,
que podem ser vistas isoladamente, deseja conter e despertar emoções,
chegar à cabeça e ao coração.
A princípio, ler é escutar, mas também olhar e contemplar.
Se a influência dos primeiros relatos permanecerá pela vida
toda, o mesmo pode-se aplicar a esses primeiros livros ilustrados que
são como brinquedos, que se olham e se lêem muitas vezes.
As ilustrações podem limitar-se a completar a informação
que o texto leva à mente, mas podem introduzir novos elementos
na narração, ou ir além e favorecer uma compreensão
sem descrições ou enriquecer o texto falado ou escrito pulsando
diversos recursos afetivos ou intelectuais.
A cultura da imagem não apenas interfere e altera as emoções,
mas também dificulta um pensamento coerente e bem estruturado.
Só uma aprendizagem de leitura bem-feita pode dar às crianças
as primeiras armas do pensamento, pois aprender a falar e a ler (ver,
refletir, compreender) é aprender a pensar. Às vezes, se
acentua a importância das histórias de brincadeiras para
os primeiros anos, e, de fato, são essenciais para a educação
da sensibilidade, mas são também básicos os relatos
cheios de sentido.
Mas, se a qualidade dos álbuns ilustrados que se colocam ao alcance
das crianças é fundamental, o que não mudará
nunca é o adulto-intermediário que conta e lê histórias
para e com o garoto, que responde às suas perguntas e estimula
o apetite de ler.
Luis Daniel Gonzalez é professor e
especialista em literatura infantil.
Fonte: INTERPRENSA - www.interprensa.com.br
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Apesar da
cultura da imagem, os livros ainda são a melhor
forma de estimular as crianças a pensar
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