Portal da Família
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Algumas empresas precisam acreditar que uma pessoa
está velha para o mercado somente quando pára de sonhar,
de querer aprender coisas novas e sobretudo de amar e respeitar a vida.
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Os mais antigos devem lembrar que era considerado um hábito saudável chegar em casa depois de um dia estafante de trabalho e, a um certo momento, sentar-se na poltrona predileta e deliciar-se com a leitura do jornal do dia - até então não existia televisão no Brasil. Hoje é uma agressão ao bom senso, ao espírito, à alma e ao coração você ler o jornal ou assistir ao noticiário da tv - e eu nem preciso explicar porquê. Felizmente, existem as exceções para justificar essa palavra. Eu tenho um ótimo exemplo disso. Em algum dia da segunda semana de fevereiro abri o "Estadão" e lá estava a manchete: "APOSENTADA DE 81 ANOS É CALOURA DA PUC" ! Uau! Para me certificar
de que não se tratava de algum criativo
apelo de propaganda&marketing para algum
produto rejuvenescedor, li a notícia na
íntegra. E era isso mesmo: a senhora Ana
Prado Ferreira, de Campinas, aos 81 anos de idade,
entrou em Letras, na PUC, e agora realiza seu sonho
de cursar uma Universidade! Naquela mesma semana,
começou a freqüentar as aulas. E como
se não bastasse, ainda quer estudar inglês e
aprender a "mexer" com computador. Gente, quanta
energia, quanto vigor, quanta disposição para
sonhar, realizar os sonhos e ser útil á
sociedade - aos 81 anos de idade! A leitura dessa saborosa notícia me fez lembrar de uma outra coisa inversamente desconfortável, relacionada à questão da idade: qualquer brasileiro para se candidatar ao cargo de Presidente da República precisará ter pelo menos 35 anos de idade. E por ironia, é justamente a partir dessa idade que as portas do mercado de trabalho começam a se fechar para o indivíduo! Isso, confesso, eu nunca entendi. Com 50 ou 55 anos de idade, um sujeito pode presidir um País como o nosso, mas não pode ser auxiliar de escritório numa sapataria! Mesmo algumas grandes organizações estabelecem 65 anos de idade como fim de carreira até para seu presidente e diretores, por mais competentes que sejam, impondo-lhes o afastamento compulsório. Se é do "staff", o executivo recebe polpudas gratificações e nem vai sentir tanto a questão da idade. Mas...e se é "um pobre mortal"? Aí tem algumas alternativas: vestir o pijama, entrar em depressão ou bater na porta de outras empresas para ver se consegue sair do rol dos excluídos. Dentre outras tantas lamentáveis discriminações feitas por algumas organizações, uma das mais injustas e vergonhosas é justamente a de rotular de "velhos" (leia-se: imprestável, doente ou incompetente) os profissionais que passam da inadequadamente chamada "idade competitiva". E se vocês querem mesmo saber de uma coisa, nenhum exército de jovens MBAs consegue competir em conhecimentos práticos, em vivência, estabilidade e autocontrole com uma pequena tropa da chamada Terceira Idade. Não tenho nada contra os jovens MBAs, mas tenho tudo contra os preconceitos. Há um monte de exemplos que eu poderia dar para atestar o vigor, a capacidade produtiva e a utilidade dos considerados "velhos demais para o trabalho" por algumas empresas mal informadas. Em Joinville, está em plena atividade o senhor Bruno Brodbeck, de 82 anos, o bombeiro mais idoso em ação no País! A grande poetisa Cora Coralina publicou o seu primeiro poema aos 75 anos; o sambista Cartola gravou seu primeiro samba aos 65 e cantava "Velho é o seu preconceito". O jornalista Roberto Marinho fundou a sua poderosa Rede Globo ao 65 anos. O mais velho presidente das empresas constantes do Guia Exame do ano passado ("As 100 Melhores Empresas para Você Trabalhar") chama-se Leopoldo Celestino Killing e, aos 80 anos de idade, é quem toca a gaúcha Tintas Killing. O americano Ray Kroc iniciou aos 52 anos de idade o que viria a ser o império da McDonald's, a maior e mais conhecida marca do planeta, com mais de 30 mil restaurantes e 1,5 milhão de funcionários distribuídos por 121 países. Quando alguém ousou perguntar ao famoso violoncelista, Pablo Casals, porque aos 95 anos ainda praticava 6 horas por dia, ele retrucou: "Ah, meu filho, preciso me aperfeiçoar, ainda tenho muito que aprender!". Pois é, minha gente, e, no entanto, como reforça
o artigo do jornalista Gilberto Dimenstein em seu site "Aprendiz", "depois
dos 45 anos de idade, as chances de conseguir emprego de executivo são
mínimas. De acordo com levantamento da Catho, especializada em
recursos humanos, apenas 9% das empresas contratam gerentes acima dessa
idade - o levantamento é baseado em entrevistas com 1.356 empregadores.
Se analisarmos, pela mesma pesquisa, a faixa etária de 51 a 55
anos, a média despenca para 2%. Um degrau acima, de 56 a 60 anos,
atinge-se o patamar próximo de zero, mais precisamente, 0,65%". Felizmente, como já disse, há gloriosas exceções. Desde 1997, por exemplo, o Grupo Pão de Açúcar mantêm um programa pioneiro no setor supermercadista brasileiro visando valorizar e oferecer uma nova chance de trabalho às pessoas da terceira idade: atualmente, emprega mais de 800 idosos que atuam em funções de empacotador, caixa e recepcionista em suas lojas espalhadas pelo Brasil. Não é minha
intenção ficar aqui discorrendo sobre
exemplos reais que provam a utilidade, competência e
produtividade dos chamados "idosos". O que quero
mesmo é sensibilizar algumas empresas para
que percebam que os tempos mudaram não só
para os jovens, mas também para os velhos.
Por isso mesmo, a própria Organização Mundial de
Saúde reconsiderou a idade determinante da
velhice que, de 65, foi elevada para 75 anos, em
função de sérios estudos e
levantamento estatístico mundial, que atestou
o aumento progressivo da longevidade e da expectativa
de vida. Finalizando: sei
que este ou qualquer artigo não tem o poder
de quebrar preconceitos, acabar com discriminações
ou mudar paradigmas ultrapassados. Tudo o que
posso fazer é pedir às empresas que
adotam um número qualquer de anos como "idade
limite para contratação" que admita
poder estar enganada. Dê uma oportunidade ao
idoso, dê-lhe metas, trate-o como aos demais,
tanto nas cobranças como nos reconhecimentos.Você
poderá ter agradáveis surpresas ao
perceber o resultado desta alquimia que funde a impulsividade
e o vigor do jovem com a maturidade e a
experiência do idoso. Se todos (ou a maioria)
agirem assim, talvez seja possível resgatar
a auto-estima dos idosos e torná-los cidadãos
outra vez. E aí, finalmente, poderemos
admirar a poesia "Retrato", de Cecília
Meirelles, somente nos livros e não na vida
real, sem passar pelo desconforto de flagrar um
"velho", na sua solidão, murmurando diante
do espelho: "Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim magro, nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo. Eu não tinha estas mãos sem força, tão paradas e frias e mortas; eu não tinha este coração que nem se mostra. Eu não dei por esta mudança, tão simples, tão certa, tão fácil. Em que espelho ficou perdida
a minha face?"
O reflexo desse espelho, descrito com tanto talento pela poetisa, não é real, é desenhado pelos preconceitos de uma sociedade excludente. Seguramente nós podemos e devemos dar-lhe o contorno certo e justo. Aquele contorno de um rosto que é capaz de sorrir, de beijar, de falar coisas sábias e cujas rugas só fazem embelezar porque representam vivência e conhecimento - que podem ser úteis em qualquer empresa que acredite que uma pessoa está velha para o mercado somente quando pára de sonhar, de tentar, de ousar, de querer ser útil, de querer aprender coisas novas e sobretudo de amar e respeitar a vida. Neste terreno, os jovens e competitivos empresários devem o quanto antes plantar boas sementes porque certamente será um jardim que um dia visitarão, já que o tempo avança para todos. Que ajam agora com razão e sensibilidade para que o futuro os acolha com a gratidão e o reconhecimento de que serão merecedores. (*) Floriano
Serra é psicólogo, palestrante e consultor de empresas
na área comportamental e presidente do IPAT -Instituto Paulista
de Análise Transacional (www.ipat.com.br)
e da SOMMA4 Desenvolvimento Pessoal e Organizacional. |
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