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DOIS PROBLEMAS - VIRTUDES, IDADES E MOTIVOS |
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Por David Isaacs
Ao falar tanto de exigência, alguns educadores podem pensar que existe uma série de perigos. Por exemplo: que estamos tirando a espontaneidade e criatividade à criança. Em uma palavra, não lhe estamos fazendo livre. E outro problema consistiria na possibilidade de que estes hábitos realmente chegassem a ser rotina sem sentido. No que se refere à liberdade, há uma explicação muito clara. Um dos componentes da liberdade é a capacidade de escolher entre várias possibilidades. Imaginem que se trata de escolher entre jogar tênis ou não jogar. Se a pessoa sabe jogar, existe a possibilidade de escolher. Se não sabe, não é livre de escolher neste momento. O mesmo acontece com as virtudes. Aos dezesseis anos um jovem quer ser generoso, mas jamais aprendeu a sê-lo. Que acontecerá? Não será generoso, porque não tem opção. Não se pode adquirir um hábito em um momento, porque é a própria repetição do ato o que permite falar de hábito. Com respeito ao segundo problema, a rotina pode entender-se como a realização de alguma atividade sem sentido. Indubitavelmente, haverá rotina se tratamos a virtude como fim em si e não como meio para alcançar o Bem. Não se trata da ordem pela ordem, mas para conseguir uma convivência feliz ou uma eficácia real, por exemplo. Ora, há atos que de acordo com o desenvolvimento da virtude e portanto da idade da criança, estarão mais dirigidos para algum fim. Por exemplo, a criança pequena desenvolve a virtude da perseverança atando os cordões dos sapatos. Existe uma finalidade muito clara para a criança. Entretanto, os mais velhos atamos os sapatos, quase sem dar-nos conta - inclusive pensando, em outras coisas -. E nem, por isso, vamos dizer que o ato - já rotineiro - perdeu seu sentido. Neste caso, por haver adquirido uma habilidade, já é possível esforçar-se em outras coisas mais importantes -ou mais adequadas às possibilidades da pessoa -. Em uma palavra, devemos aproveitar o alcançado para continuar melhorando. VIRTUDES, IDADES E MOTIVOS Há duas virtudes por trás de todas as demais. Me refiro à prudência e à fortaleza. Sem elas não há virtude possível. "Escolher o Bem constitui a prudência; não abandoná-lo, apesar dos obstáculos, das paixões e da soberba constitui respectivamente a fortaleza, a temperança e a justiça". E assim temos as chamadas virtudes cardinais. A nível operativo, a prudência supõe que não se perde de vista o por quê da ação. Se não existe prudência, a virtude pode terminar sendo um fim. Pensem na virtude da ordem. Quem se proponha ser ordenado como fim em lugar de como meio, pode terminar sendo maníaco da ordem. A sinceridade, sem prudência, pode traduzir-se, em desenfreio verbal. Sempre há dois vícios diretamente contrários a uma virtude "um abertamente contrário, e outro que tem as aparências da própria virtude". Por exemplo: ordem - excesso de ordem, desordem; laboriosidade - trabalho sem limites, preguiça. Na prática é mais razoável desenvolver a virtude da prudência relacionando-a com outras virtudes e, portanto, haverá que inclui-la em todas as idades. Também a fortaleza, que possui sua dupla vertente de acometer e resistir, permite, mediante a vontade, o esforço necessário para adquirir o hábito. De todas as formas, se pode insistir de um modo especial em cada uma destas virtudes de acordo com uma série de variáveis que a seguir vamos considerar. Para decidir que virtudes deveriam ser consideradas prioritárias em cada momento, é necessário ter em conta diferentes fatores. Concretamente: 1) os traços estruturais da idade em questão, 2) a natureza de cada virtude, 3) as características e possibilidades reais do jovem que estamos educando, 4) as características e necessidades da família e da sociedade em que vive o jovem, 5) as preferências e capacidades pessoais dos pais. A seguir, vamos sugerir uma distribuição de virtudes, tendo em conta os dois primeiros fatores, mas sem contar com os demais. Portanto, conviria comentar brevemente estes outros fatores. Um esquema de virtudes a educar de um modo preferente, baseado em qualquer teoria, não deve ser usado como base rígida para condicionar a atuação dos pais. Em todo caso, pode servir como uma base flexível, em torno à qual os pais podem refletir para a seguir concretizar sua atuação em sua situação particular. Entre os fatores a ter em conta, encontramos as características e possibilidades reais do jovem, por uma parte, e as preferências e capacidades pessoais dos pais, por outra. Estou estabelecendo o problema de encontrar um acordo entre o que alguém deveria fazer (de acordo com as necessidades do jovem) e o que alguém quer e pode fazer (por preferências e por capacidades pessoais). É fácil pensar que unicamente se trata de atender ao que necessita o jovem. Mas a realidade mostra que, muitas vezes, atuamos melhor em coisas que nos agradam, que nos apetecem. Por isso, será necessário estabelecer algum tipo de critério para saber que fator deveria prevalecer em caso de desacordo (isto seria o caso de alguns pais que vêem que seu filho é especialmente irresponsável; ao mesmo tempo estão especialmente entusiasmados para que seu filho seja generoso; a pergunta seria: "Que virtude devemos considerar prioritária?"). Não é possível dar uma solução concreta. Somente podemos apontar, como sugestão, algumas idéias a levar em conta. Os pais não devem pensar em um modelo de comportamento preestabelecido ao qual o filho deve aspirar. Mas, sim, necessitam saber que critérios fundamentais querem compartilhar com seus filhos. Se chegam a compartilhar esses critérios, haverá uma família unida e uma atuação com estilo pessoal por parte de cada membro. Neste sentido, o desenvolvimento das virtudes em uma família não supõe um mesmo comportamento mas, ou melhor, uma unidade de propósito. Concretamente, cabe pensar que se trata de cultivar de um modo preferente a virtude que proporciona maiores possibilidade para que o filho desenvolva seus pontos fortes a serviço dos demais e, ao mesmo tempo, tenda a fortalecer seus pontos fracos. A virtude, neste sentido, está em função da eficácia; do bom funcionamento de cada pessoa. A virtude mais apta para atender de um modo especial, em um momento dado, pode considerar-se como aquela que produz maior rendimento, satisfação pessoal e desenvolvimento pessoal. A preocupação dos pais pode centrar-se, portanto, em concentrar-se no positivo de seus filhos - as virtudes que já têm razoavelmente desenvolvidas - e também no que é insuficiente. Em segundo lugar, a família é uma organização natural que exige o apoio de todos seus membros. Para conviver, aprender dos demais e ajudar a cada um dos demais a melhorar (dever de todos os membros), se trataria de cultivar algumas virtudes que permitam esta mútua ajuda. E, por último, sabendo que as virtudes se complementam, podemos considerar, nessa unidade, a alegria como conseqüência do desenvolvimento harmônico das virtudes e, além disso, utilizá-la como critério. Em que virtudes deveriam insistir os pais? Naquelas que vão produzir maior alegria para toda a família. Se falta alegria na família é porque não se estão cultivando muito as virtudes, ou não existe um equilíbrio razoável em seu desenvolvimento (recordem os vícios causados por excesso ou por ser contrário à virtude). Em uma palavra, se trata de fazer coincidir os gostos pessoais com as necessidades e com os gostos dos demais, precisamente por compartilhar alguns critérios fundamentais. Aqui sugerimos dois: o dever de cada membro da família a ajudar aos demais a melhorar, e a alegria. (*) Fonte: Auto-avaliação das virtudes humanas, de David Isaacs |
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