Brasileiros e americanos são iguaizinhos numa coisa: a maioria acha a
Europa um tiquinho de nada, tão pequenininha, tudo é tão perto! A gente
pega um vôo nessas companhias aéreas budget, paga o equivalente
a uns 50 reais e está em Madrid para o fim de semana. Assim, num estalar
de dedos. Duas horas e meia de vôo. Isso é nada para nós, vindos desses
países de dimensões assustadoras. Claro, para os europeus tudo é longe.
Uma viagem transatlântica é, para alguns, uma aventura a ser estudada
com anos de antecedência.
Pois é, quando a gente está no país - ou melhor, no continente dos outros
- acaba aproveitando mais as vantagens do que os próprios nativos. Não
por esnobismo, mas por curiosidade mesmo. E pela providência de ter amigos
fiéis em diversos lugares, prontos a nos hospedar e guiar.
Depois de algumas andanças, acabei por associar alguns desses bons amigos
com alguma comida peculiar, algum momento gastronômico que dividimos.
E comida não é sempre um bom pretexto para colocar amigos numa mesma mesa?
Bem, talvez na Inglaterra ou na Irlanda o melhor pretexto é o bar, mas
aí já começa uma outra história.
Paris, por exemplo, sempre vem associada ao Plínio e à Jeanne. Ele, brasileiríssimo,
já rodou meio mundo, cozinhando, escrevendo, aprendendo. Apaixonou-se
por Paris, mas não pela comida francesa. Sempre que vamos à sua casa não
se come em restaurante. E nem é preciso: além de ser fanático por supermercados,
Plínio é um pizzaiolo de mão cheia. Faz pizzas em casa como ninguém. E,
modesto, diz que aprendeu a receita da massa numa latinha de pó Royal…
Já a Jeanne é a rainha dos queijos. Francesa da cabeça aos pés, ela preza
as riquezas da terra e escolhe vários tipos pessoalmente, lá no interior,
onde tem uma casinha de campo. Bastou saber que tem visitas e Jeanne pega
a auto-estrada rumo ao village: lá, ela conhece o homem que faz
camembert em casa; o produtor do vinho; a melhor patisserie e assim
por diante. Põe tudo no porta-malas e traz para as visitas. Depois do
jantar, na hora de saborear os diversos tipos de queijo com baguette
e vinho, ela ainda decora os pratos com folhas secas do jardim.
Catarina, na Suíça, apresentou-me ao nüsli num fim de semana de
outubro. Isso mesmo, nüsli. Não, não é nada sofisticado, pelo contrário,
não passa de uma imitação de agrião. Agrião de frio. São umas folhinhas
miúdas e com um gosto que lembra o de amêndoas. Elas são um tanto gordurosas
e - assim me explicou a amiga - são sempre as últimas a resistirem à neve.
Portanto, depois que todas as verduras murcham e se queimam com o frio,
o nüsli é o único encontrado no mercado. Para comê-lo, basta temperá-lo
com azeite, sal e pimenta. É par perfeito para uma omelete.
Daniela, a italiana sem papas na língua, leva-me sempre ao mesmo restaurante,
no alto de uma montanha de onde se vê quase toda a Umbria. E onde se come
o bigoli, uma espécie de nhoque gigante com espinafre misturado
à massa. É um antipasto delicioso. Depois, come-se massa ou carne grelhada.
Mas nunca, nunca mesmo, peça cappuccino depois do jantar.
- «Isso é uma aberração», diz a Daniela. «Só turista
mesmo!».
Depois da comida, contente-se, portanto, com um minúsculo café expresso.
A Grécia é a última etapa da viagem. Lá, Alexander nos carrega para um
boteco no centro de Atenas. Lotado na tarde de sábado, mesas de madeira
sem toalha, nos pratos sempre a mesma iguaria: segundo ele, o melhor suvlaki
do país. E não há como negar. Até os menos carnívoros têm vontade de repetir
mais uma porção dos nacos de carne de carneiro bem assada, temperada sem
dó, acompanhada de verduras grelhadas e pão quentinho.
Hora de voltar para casa. Como sempre, ao final de cada festa, há aquele
contentamento de barriga cheia e coração quente. E a promessa do regime
na próxima semana.
Inês Rodrigues é
jornalista e reside em Londres.
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