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Estavam na praia fazia alguns dias. À noite a caminhada costumava chegar até o parque de diversões montado em uma das praças. Destoava da maioria dos que apareciam por ali: era novo e tinha grandes atrações, entre elas a Montanha Russa, o Chapéu Mexicano, o Delta, a Roda Gigante bem gigante...
- Nem quero ir até o parque! - a menina, filha única de cinco anos, emburrava contrariada. - Pra quê? Eu que não vou querer ir mais em aviãozinho, carrinho...
Os pais zelosos davam-se conta de que os argumentos tão bem elaborados ao longo das caminhadas anteriores tinham sido infrutíferos. Não tinham conseguido convencer a pequena de que os brinquedos ideais para a sua idade eram os aviõezinhos que voavam a três metros do chão e os carrinhos com bebês acenando.
- Você é muito pequena! Nem pode entrar! - era o pai.
- Com o pai pode! - era a filha.
O rapaz abaixou-se até ela, reduzindo seu 1.80m a menos de 1.0m, e com patética humildade explicou-se:
- Sabe, filha, é que o papai não tem coragem para essas coisas...
- Tudo bem, então! - a menina amuava o bico, com dó.
E a mãe, que desde a noite anterior questionava aquela superproteção de que a filha poderia queixar-se um dia, interveio:
- Eu vou com você.
O pai travou. A pequena sentiu romperem-se as cadeias: um sorriso pleno de liberdade brilhou-lhe nos olhos, nos dentes, nos gestos.
- Mas não na Montanha Russa! - a mãe tentava salvar um pouco a pele. - Serve o Delta?
Maravilha! A menina alvoroçava-se, a mãe nem sabia por que fizera tal opção. O Delta era uma espécie de Chapéu Mexicano, em que os pés não ficam pendendo no ar. Sobe, sobe, sobe girando as suas gôndolas e vai-se desdobrando e inclinando ligeiramente enquanto aumenta a velocidade.
Já no espaço a mãe dava-se conta do dilema em que mergulhara com toda a alma: superproteção versus morrer junto. E lembrava-se da promessa "O meu Anjo caminhará à tua frente" e pensava que seria oportuno naquele momento que " o Anjo voasse ali ao lado".
Dias depois a menina fazia a professora e os coleguinhas rirem, ao contar a sua aventura de férias:
- Eu via as luzinhas lá embaixo... Que legal! E eu disse para a minha mãe: Olha, mãe, que legal! Mas, mãe, por que você está de olhos fechados? E ela disse: "Cala a boca, menina!!!"
Anos depois, na Euro Disney, sabe-se lá por que motivos, o pai embarcou com a pequena, agora já maiorzinha, na Space Mountain - de la terre a la lune. E na primeira acelerada perdeu os óculos... Fez todo o percurso avaliando, em cada volteio, as remotas possibilidades de que suas preciosas lentes estivessem no chão da nave, ao invés de trituradas nos trilhos. Na França, sem francês e sem óculos... Só Helen Keller! Felizmente, ou graças às rezas intensas da menina a partir do momento em que o pai gritou "Meus óculos!", encontraram o precioso embaixo do banco.
Desceram inteiros, mas dali a poucos segundos o pai empalideceu assustadoramente, encostou-se à grade e ameaçou desfalecer. A mãe queria procurar algum ambulatório, porém, antes que conseguisse montar duas frases em francês nervoso, o marido a tranqüilizou, refazendo-se um pouco. Na foto oficial, o sorriso vibrante da menina e os olhos aflitos do pai, ainda por trás dos óculos, na primeira acelerada.
A seguir: Hopi Hari. A menina preveniu-se e levou duas primas. Já na compra do passaporte, declarou aos pais: "Fiquem sossegados! A gente encara!"
Ufa! Pai e mãe saborearam orgulhosos a conquista da própria liberdade. E a menina? Batia as asas, embora titubeante... Bem, sempre é possível contar com o Anjo.
Sueli Caramello Uliano , mãe de familia, pedagoga, Mestra em Letras pela
Universidade de São Paulo, Presidente
do Conselho da ONG Família Viva, Colunista do Portal da Família e consultora para
assuntos de adolescência e educação.
É autora do livro Por
um Novo Feminismo pela QUADRANTE, Sociedade de Publicações
Culturais.
e-mail: scaramellu@terra.com.br
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