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Cecília Kerche: Uma elegância clássica
Wellen de Barros |
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Dançar é deslizar pelo universo individual do ser humano capacitando-o a chegar ao infinito. Amigo, vamos refletir sobre o sentido desse universo individual como admiradores dessa arte, através da história e testemunho de vida de uma das maiores intérpretes da arte do ballet no Brasil e no mundo - Cecília Kerche. Cecília Kerche é o reflexo de uma dedicação esmerada, correspondente á uma vocação específica como arauto da própria manifestação interior. Para ela, ser uma primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro ultrapassa a dimensão meramente cênica, porque existe uma coerência peculiar no seu modo de ser enquanto profissional, aliada a uma espécie de poder "impulsionador", uma voz divina chamada consciência. Esse poder "impulsionador" tão característico dessa personalidade, pela sinceridade no pensar e no agir, conquistou admiração e reconhecimento no seu meio - melhor dizendo, conquistou notoriedade. Cecília Kerche é brasileira, nascida e criada na cidade de Lins no estado de São Paulo vem de uma família de educadores. Seus pais foram professores da rede pública de ensino e seus dois irmãos também encontraram na linguagem do corpo, um meio de realização profissional. Sua irmã, campeã mundial de aeróbica e seu irmão bailarino profissional. Cecília desde muito cedo conviveu com a realidade de um país em crescimento, onde se sonhava em adquirir conhecimento para formar opinião. Sendo seus pais professores, apreendeu muito de perto a buscar o saber, saber este que sempre apontou para os valores essenciais da vida. Não é muito difícil notar em Cecília uma extrema capacidade para viver as virtudes humanas, como por exemplo a constância - que é a capacidade de se vencer nas pequenas coisas do dia a dia; a generosidade - que é a capacidade de se preocupar com o outro; a laboriosidade - que é a capacidade de exercer um trabalho bem feito. Esta foi sempre a temática de sua família, alicerçada no grande potenciador que é o amor, passado aos filhos por seus pais. Esse caminho a ajudou ser uma das principais profissionais no ramo da dança a nível mundial e, sobretudo, a não se deixar arrastar pelo efêmero. - "Meus Pais sempre tiveram muita dificuldade para "bancar" meus estudos da dança, mas foi graças a essa dificuldade que aprendi a valorizar minha profissão e o profissional da dança. Até hoje, minha mãe não se comporta como mãe de artista. Aliás, gosto muito desse padrão, porque é o que me norteia a estar sempre dentro da realidade. Sei separar "tietagem", de uma amizade sincera, e devo isso à educação que recebi dos meus pais. Minha mãe nunca foi de elogios. Ela me prestigia, porém sempre com muita sobriedade em relação ao meu trabalho. É uma grande educadora... Recordo que um dia reclamei sobre a variedade da comida à mesa, pois havia apenas banana frita, feijão e arroz. Minha mãe respondeu: - "Você está reclamando? Meus alunos comem pano de refeição". Nossa! Aquela resposta foi uma lição para toda vida. Já imaginou comer pano no almoço?" Aos 15 anos tive a sorte de conhecer Pedro Kraszczuk, fabricante de sapatilhas e também bailarino e que me incentivou muito. Acabamos nos casando e estamos juntos há 25 anos. É ele quem cuida da minha carreira. Eu estudava ballet desde os 8 anos, mas foi aos 15 que comecei a dançar mesmo. Pedro patrocinou as sapatilhas e custeou meus estudos". É natural na interpretação de Cecília Kerche essa elegância clássica, porque é algo que reflete a sua alma, seu modo de ver o ser humano como um todo. - "A gente não passa ileso por essa carreira, que tem a sua
maravilha, a sua magia, mas também tem a parte dolorida. O artista,
assim como o atleta, aprende a encarar as lesões como parte do
trabalho. Não há ganho sem dor (...)". Como toda adolescente Cecília tinha sonhos, dúvidas e muitas vezes foi preciso "engolir o choro" para adaptar-se a um novo mundo com uma disciplina de estudo enfadonha. "- Mal sabia, que mais tarde, não só iria percorrer a Capital Paulista, mas as principais capitais do mundo." "Aos 15 anos eu me determinei que até os 25, eu seria primeira bailarina do teatro mais importante do país. Por incrível que pareça, ao completar 25 anos no mês de Outubro, dois meses depois fui nomeada primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro". É assim a simplicidade madura dessa bailarina, que consegue através das circunstâncias da própria profissão - extrair sentido de cada dificuldade ultrapassada. A vocação especial de ser artista traz uma conexão implícita entre a ética e a artística, porque exerce um chamado do servir a quem é dado esse talento, através da própria execução do seu trabalho enquanto Ser, é portador de elevação cultural para quem assiste, uma vez que cultura para o ser humano não é algo acidental, mas aprimoramento espiritual. "- Qual a idéia que se faz nos dias de hoje sobre arte? Entretenimento
ou Cultura? "O Sol brilha para todos", é uma frase aparentemente corriqueira e sem grandes pretensões, mas dito por Cecília ganha força e profundidade. O que dizer de um modo de pensar ético, sobrepondo-se ao bem estar
pessoal? Cecília Kerche faz do seu talento, um veículo de transcendência e racionalidade, num modo de atuar que dá forma e significado a algo já existente. Numa magnitude de movimentos cuidadosamente elaborados com o requinte de uma expressividade suave inunda o universo pessoal do expectador. Sua interpretação comunica, porque transmite verdade e transmite verdade porque realiza. Uma carreira sólida com reconhecimento internacional e principalmente no seu país lhe dá a sabedoria e serenidade de missão cumprida que os vitoriosos merecem desfrutar. Ela se considera uma bailarina à moda antiga, cuja arte resiste ao tempo e se aprimora com ele. - "Claro que o trabalho ideológico nunca estará concluído, mas estou deixando pelo menos uma esperança para esta geração e as que virão. Uma esperança - já concretizada, - de que é possível fazer arte, ballet no Brasil, uma vez que sou de escola exclusivamente brasileira, nunca estudei em outro país. Quando viajei, foi para dançar em 17 companhias estrangeiras, em mais de 20 países. Fui como convidada e não para aprender. Tudo que aprendi, foi aqui no Brasil". É uma afirmação "ousada" e resoluta para as necessidades que envolvem o artista nacional, sobretudo, uma característica de auto - estima pelo seu país e seu legado. Um de seus sonhos é ver o Brasil como um dos centros mundiais de produção de dança. Alguém, "à moda antiga", como ela mesma se define quando não está atuando, gosta das coisas simples da vida como ir ao cinema, ler, bordar, cozinhar. De fato, as coisas simples da vida trazem ensinamento. Uma trajetória através de muitos personagens que formam
uma trilogia de atuação na arte dessa profissional: "O
Lago do Cisnes" - com sua majestade artística na infinitude
técnica. Pode-se concluir que a trajetória do universo individual que Cecília Kerche apresenta através de sua arte vai ao encontro das palavras de Ana Sánchez de la Nieta, que define elegância "como a adequação do atraente com a forma pessoal de ser, de pensar e de agir". Que significado a arte de Cecília Kerche pode atribuir a vida particular de cada um nessa linguagem de comunicar o invisível através da verdade pessoal do intérprete, que utiliza toda a sua arte para chegar ao expectador? Wellen de Barros
Wellen Barros - Primeiro Soprano integrante dos corpos artísticos do Theatro Municipal do Rio de Janeiro (Coro). Preparadora artística de bailarinos premiados nos principais festivais de dança. Pesquisadora sobre música, dança, teatro e suas interpelações. Participante do grupo de estudo sobre o Dramaturgo William Shakespeare, sob orientação da maior especialista brasileira no assunto - Bárbara Heliodora. Administra o BLOG da primeira bailarina do Theatro Municipal - Cecília Kerche (Kercheballet - http://kercheballet.blogspot.com) e o BLOG Sala de Concerto (http://salaconcerto.blogspot.com). E-mail: wellenmbarros@gmail.com |
"Esmeralda"
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