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Família: inveja e ciúme entre irmãos

María José Díaz-Aguado

O ciúme e a inveja são sentimentos complexos, estreitamente  relacionados, que se acham presentes nas relações entre irmãos. O nascimento de um bebê causa um forte impacto no irmão primogênito, que deverá aprender a compartilhar a atenção de seus pais, da qual, até então, usufruía com exclusividade. 

Embora existam importantes diferenças individuais quanto à forma de vivenciar as relações entre irmãos, estas relações costumam caracterizar-se quase sempre pela intensidade e ambivalência. Por um lado, suscitam um grande interesse, bem como oportunidades para que se aprendam relevantes habilidades sociais e emocionais; ao mesmo tempo, porém, essas diferenças podem originar  uma indesejável fonte de conflitos e tensões, tais como se manifestam pela freqüência com que geram inveja e ciúme.

Sentimentos complexos.

A inveja se origina e se manifesta pela percepção, no outro, de algo que se deseja. Trata-se, com efeito, de um sentimento muito complexo e ambivalente, no qual se mesclam emoções de natureza contraditória, como por exemplo: o desejo de possuir o que o outro possui, a admiração pelo que o outro conseguiu, a dor ou o sofrimento por não conseguir o mesmo que o outro, a indignação por considerar injusta a diferença que se observa, ou a incerteza por não compreender a que se devem tais diferenças produtoras da inveja.

É importante distinguir o que se costuma denominar, e com acerto, inveja sadia – aquela que age como um motivo construtivo para alguém tratar de obter aquilo que inveja, mas sem dificultar a relação com o próprio invejado – da inveja destrutiva, que cria obstáculos a ambas as condições expostas.

A inveja se origina basicamente numa relação entre duas pessoas: o invejoso e o invejado, ocorrendo mais freqüentemente nas relações que apresentam certa simetria (entre irmãos consangüíneos, entre companheiros ou entre amigos), ao passo que o ciúme implica sempre uma terceira pessoa com a qual o ciumento mantém ou deseja manter um vínculo de exclusividade, pois não se conforma em compartilhá-lo com mais ninguém. 

Os dois problemas ocorrem porque a pessoa se sente ameaçada, ainda que de forma diferente. Invejar o que não se tem resulta em problema quando o fato de não se ter o que se quer ter é vivenciado como uma ameaça ao próprio valor. No caso do ciúme, a ameaça provém do risco de se perder um vínculo afetivo que o ciumento havia estabelecido, ou imaginado, com relação a uma pessoa. Em certo sentido, o ciúme pode ser considerado um tipo especial de inveja.

Acontece que estes dois sentimentos (inveja e ciúme) às vezes se acham intimamente ligados. Por exemplo, o ciúme de uma criança, causado pela atenção que seus  pais dedicam a um seu irmão, incorpora-se de pronto à inveja das características que suscitaram tal atenção (o fato de se tratar do menorzinho, ou de um outro irmão tirar sempre boas notas na escola etc.). 

Nasce um irmão

O nascimento de um irmão costuma causar um grande impacto nas crianças, especialmente no primogênito, que até então tinha sido o único a receber toda a atenção de seus pais, e passa a sentir-se preterido na dita atenção pelo  irmãozinho recém-chegado. Estudos realizados sobre este assunto revelam que durante os meses subseqüentes ao novo nascimento os primogênitos menores de cinco anos, em sua grande maioria, manifestam os seguintes transtornos:

1) Alterações que refletem tensão emocional: problemas no sono e no controle dos esfíncteres, choro freqüente, retraimento, perda significativa (ou diminuição) da autonomia e da concentração. Estes transtornos costumam desaparecer por volta dos oito meses do nascimento do bebê.

2) Hostilidade para com a mãe e às vezes para com o pai, aos quais passam a desobedecer de forma bem mais freqüente que antes de tal nascimento. Estes problemas são especialmente intensos nos primeiros meses, mas costumam diminuir sensivelmente ao cabo de um ano.

Para se compreender a causa de tais distúrbios no comportamento, convém levar em conta o fato de que durante os meses que seguem  ao nascimento de um irmão, a maioria dos filhos, especialmente no caso de primogênitos, manifesta ciúme quando a mãe ou o pai ou ambos  se concentram no atendimento ao recém-nascido (alimentando-o ou dando-lhe banho, por exemplo). São momentos, notadamente, que o primogênito “elege” para fazer tudo o que seus pais lhe proibiam e até o momento ele se habituara a obedecer.

Esta tendência pode ser interpretada como sendo a primeira manifestação de ciúme, decorrente do fato de que seu irmão menor recebe uma atenção especial, que ele já não está recebendo. Nesta manifestação do mais velho, subjaz a comparação feita, por este, entre a atenção recebida dos pais, pelo irmãozinho, e  a que ele não recebe mais.

Com a nova conduta desobediente, a criança expressa seu desgosto ante tal situação, e procura chamar a atenção dos adultos. Atenção, diga-se, que ainda que obtida de forma negativa, como crítica ou castigo, às vezes é preferível, para ele, ao fato de se sentir preterido pelos pais.

Antecipar tais situações, evitando que se produza na criança auto-rejeitada a comparação negativa (dando-lhe um papel de destaque ou a atenção de outro adulto), ajuda a prevenir o ciúme que a nova situação suscita. 

Curiosidade e interesse

Por outro lado, o nascimento de um irmãozinho é um acontecimento que proporciona à criança, em qualquer idade, uma enorme curiosidade e interesse em atendê-lo e cuidar dele. O fato de que este interesse possa surgir  tanto em meninos quanto em meninas que apresentam intensas alterações emocionais, reflete a forte ambivalência que caracteriza as relações entre irmãos.

Baseando-se neste interesse, conviria que os pais se dispusessem a partilhar com o menino ou com a menina maior a rotina nos cuidados com o bebê. Deixá-los participar ativa e construtivamente nessa rotina, fazendo com que se sintam importantes  e  necessários nessas tarefas, é um dos meios mais eficazes de coibir tanto o ciúme como a inveja.

A intensidade nas manifestações de ciúme ante o nascimento de um  irmão costuma variar em função de:

1) A idade da criança no momento do nascimento de seu irmão. Menores de dois anos em geral manifestam o seu  mal-estar de forma mais encoberta, apelando para o retraimento, enquanto crianças de três e quatro anos  tornam-se mais desobedientes e exprimem suas exigências de forma bem mais explícita. A partir dos cinco anos, o ciúme (assim como as demais alterações originadas pelo nascimento de um irmãozinho) tende a diminuir. 

2) A mudança originada pela nova situação. Quando o nascimento do irmãozinho coincide com outras mudanças importantes na vida do filho mais velho (mudança de casa, significativa  diminuição da atenção recebida, aumento do nível de exigências ou de críticas dos pais...), o ciúme costuma ser muito maior. Para preveni-lo, torna-se necessário reduzir ao mínimo tais mudanças, ou  antecipá-las, quando se prevê que elas vão ser inevitáveis. Por exemplo, se for o caso de uma mudança de casa, conviria realizá-la uns meses antes do nascimento do irmão.

3) A relação que a criança mantinha, antes, com os pais. Quando a relação com a mãe era demasiado forte e não existia uma boa relação com o pai, o ciúme do irmãozinho tende a ser maior, devido à considerável redução da atenção materna, que o primogênito passa a vivenciar. O fato de que a criança possa usufruir de uma intensa relação com o pai (antes e depois do nascimento do irmão) amortiza o impacto decorrente desse nascimento e colabora na prevenção do ciúme.

4) A quantidade de atenção que cada um dos progenitores dedica ao bebê. Quanto maior for essa atenção, especialmente em comparação com a que dedicam ao primogênito, maior será a probabilidade de que este sinta ciúme do irmãozinho. Nisto se baseia mais uma vez a origem do ciúme, que só vem à tona quando se compara a atenção recebida com a que recebe o outro e com a que recebia antes.

5) O papel de destaque que os pais dão ao primogênito no cuidado do pequenino. Os pais podem ajudar o filho a assumir o novo papel de irmão mais velho, estimulando-o a participar no cuidado do bebê, de forma que se sinta competente e importante em tais situações. Quando agem assim, é menos provável que o filho maior se sinta relegado e procure recuperar a atenção dos pais,  criando problemas para si e para eles.

Já se constatou que os pais que conseguem atrair o filho mais velho à participação nos cuidados do caçulinha, conversando com ele de igual para igual sobre as necessidades do bebê e o significado do que expressa, contribuem para  desenvolver o interesse do primogênito pelo irmãozinho, e evitam que se sinta rejeitado por causa da atenção que inevitavelmente deve receber o mais novo.

Assumindo diferentes papéis 

Com freqüência, à medida que os irmãos vão crescendo, parece que  distintos papéis psicológicos se evidenciam. O fato de que um dos filhos comece a sobressair em uma determinada qualidade costuma acentuar sua tendência a desenvolvê-la, como se o fizessem assumir esse papel (o de estudioso, o de responsável, por exemplo), descartando o mesmo papel para os outros filhos, que se vêem orientados a encontrar e assumir o seu próprio e diferenciado papel (o de sociável, o de desportista etc.).

Esta distribuição de papéis demonstra a necessidade que cada menino e cada menina têm em desenvolver sua  própria identidade, diferenciando-a da dos demais irmãos. Necessidade que tende a ser muito acentuada na adolescência e nos anos que a precedem, podendo chegar a ser estimulada em excesso quando os adultos evidenciam com freqüência as qualidades de um dos filhos em um determinado âmbito (os estudos ou o esporte, por exemplo), sem que destaquem tais qualidades nos demais. 

Como prevenir para que isso não aconteça

Para o favorecimento de relações adequadas entre irmãos e para prevenir o ciúme e a inveja entre eles, é aconselhável que:

1) Se a criança conta com mais de um adulto para proporcionar-lhe a segurança e atenção desejáveis (a mãe e o pai, por exemplo), torna-se mais fácil, para ela, superar o ciúme com relação aos seus irmãos menores. O simples fato de que tanto o pai como a mãe se relacionam adequada e freqüentemente com a criança supõe outras vantagens educativas, como a de facilitar a tarefa dos adultos, além de favorecer a capacidade do filho ou da filha de se relacionar bem com outras pessoas e situações novas.

2) Convém evitar que o nascimento de um irmão coincida com outras mudanças importantes na vida da criança (adiantando-as ou postergando-as) e não  reduzindo, após o nascimento do bebê, a quantidade e a qualidade da atenção que a mãe e o pai passam a dedicar ao filho ou filha maior. 

3) Para ajudar o filho a assumir o novo papel de irmão mais velho e prevenir o ciúme que aparece  com freqüência  quando a mãe ou o pai estão absorvidos no  cuidado do bebê, convém estimular a sua participação nesses cuidados, de forma que o filho se sinta importante e prestativo em tais situações, ou que possa dispor, nesses momentos, da atenção de pelo menos  um dos progenitores. 

4) Para impedir que a tendência à distribuição de papéis entre irmãos prejudique uns e outros, o que os levaria a desconsiderar aspectos fundamentais de seu desenvolvimento psicológico (os estudos, os amigos, a atividade física...), aconselha-se que os pais:

Dêem a devida atenção e coloquem em evidência para todos de casa os progressos de cada criança, em diferentes setores, sobretudo nas atividades que constituem as especializações dos demais, e sempre tomando a própria criança como referência, para valorizar  o seu progresso em determinada situação anterior.

Quando existem grandes diferenças entre os irmãos, não é aconselhável utilizá-las como referência para valorizar o nível de cada um, devido ao efeito desalentador que poderia causar, como também pelo risco de despertar um problema emocional de inveja.

Por outro lado, o modelo de um irmão que  sobressai pode, sim, ser utilizado como referência ideal do nível que se quer atingir, de forma a suscitar a imitação ou uma inveja sadia por parte dos demais.

dois irmãos

María José Díaz-Aguado é Catedrática de Psicología Educacional.
Fonte: http://www.edufam.es/mostrar_recurso.php?id=2578
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Tradução: mcferreira

 

Publicado no Portal da Família em 09/07/2008

 

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