Portal da Família
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DIREITOS HUMANOS: QUESTÃO SEMÂNTICA |
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André Gonçalves Fernandes |
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Dada a inviabilidade da revolução pelas armas, Gramsci (1891-1937) sugeriu o caminho da progressiva intoxicação ideológica da cultura, da linguagem e do pensamento de uma sociedade. O trabalho de envenenamento da linguagem é feito pelas conferências e congressos patrocinados pela esquerda militante. A lavagem cerebral gramsciana, ao que parece, atingiu as mentes dos idealizadores do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH III). Nele, há uma série de armadilhas semânticas que transmitem a idéia de “novos direitos humanos”. A censura aparece suavizada como “controle da qualidade jornalística". O fim da propriedade privada se apresenta como "novos anteparos jurídicos para mediar os conflitos de terra". O patrulhamento e proselitismo gays são expostos como reconhecimento de “(...) todas as configurações familiares constituídas por lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, com base na desconstrução da heteronormatividade”.Só faltava a criação uma nova ditadura sob a divisa da "democracia direta"... A idéia de “novos direitos humanos” se tornou usual. E, naturalmente, fascina. Por dois motivos: a novidade e os direitos humanos. Na vida, a novidade se impõe com freqüência: um novo filho, uma nova casa, um novo horizonte profissional. E a consciência atual aspira que todos os homens possam ter seus direitos atendidos. Contudo, essa expressão não é tão inocente quanto parece. Carrega uma carga semântica diversa. Discorre-se sobre “novos direitos humanos”, referindo-se aos “diferentes” que, a despeito da “diferença”, lutam para alcançar não somente aquilo que se refira a eles, mas também tudo aquilo que usufruem os “normais”. A expressão em foco é usada para tratar de temas que muitos pretendem furtar de qualquer vetor ético para relegá-los ao âmbito de uma mera política pública. A expressão sob análise é ambivalente, pois funciona como veículo de idéias que, no fundo, contradizem aquilo que significam à primeira vista. Uma vez manipulada, circula por todos os ambientes sociais. Não é o homem inteligente que a usa como própria, mas é a linguagem, imposta pelos grupos de pressão, que fala dentro dele. Heidegger já afirmava que não é o sujeito singular a falar, mas a linguagem que fala em nós. Orwell já profetizava, no livro “1984” que o big brother manipularia a linguagem para que significasse o oposto daquilo que falava. As palavras são sinais inventados pelo homem, enquanto animal loquente (que possui a palavra) e significante (que se expressa). A palavra é sempre relativa a um conceito e este a uma coisa. O falar vem depois do pensar e o pensamento tem sentido na medida em que se torna expressão da realidade que lhe é anterior. O acerto ocorre na reunião dos três níveis: palavra, idéia e realidade. Naturalmente, o homem tende a fazê-lo. Mas como é capaz de uni-los, é capaz de apartá-los. Quando os três mundos, o linguístico, o conceitual e a realidade posta, não estão em sintonia, as coisas deixam de ser ditas pelo seu nome: interrupção da gravidez ao invés de aborto, morte indolor ao invés de eutanásia, pílula do dia seguinte ao invés de abortivo, afetividade ao invés de amor, companheiro sentimental ao invés de cônjuge e assim por diante. Não me admira o estado atual das coisas. A cultura e a filosofia do século XX, deixando de lado o ser e escurecendo o pensamento, voltaram sua atenção mais à linguagem, um objeto verificável com a experiência, do que aos conceitos e à realidade, estruturas ontológicas objetivas. A linguagem transformou-se num sinal subjetivo, à mercê das circunstâncias de cada época. Os sofistas executavam sua profissão recorrendo ao artifício de Górgias: a inadequação entre a palavra e conceito e entre este e a realidade que representava. Discernir entre os legítimos desejos e os supostos direitos que se tenta promover por meio da manipulação da linguagem é a forma de se combater as antropologias mutiladas, porque, para se pensar corretamente os direitos humanos, é preciso uma concepção integral do homem. |
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ANDRE GONÇALVES FERNANDES, Post-Ph.D. Juiz de Direito e Professor-Pesquisador. Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP). Mestre, Doutor e Pós-Doutorando em Filosofia e História da Educação pela UNICAMP. Juiz de direito, titular de entrância final em matéria cível e familiar, com ingresso na carreira aos 23 anos de idade. Pesquisador do grupo PAIDEIA-UNICAMP (linha: ética, política e educação). Professor-coordenador de metodologia jurídica do CEU Escola de Direito. Coordenador Acadêmico do Instituto de Formação e Educação (IFE). Juiz instrutor/formador da Escola Paulista da Magistratura (EPM). Colunista do Correio Popular de Campinas. Consultor da Comissão Especial de Ensino Jurídico da OAB. Coordenador Estadual (São Paulo - Interior) da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Membro do Comitê Científico do CCFT Working Group, da União dos Juristas Católicos de São Paulo (UJUCASP), da Comissão de Bioética da Arquidiocese de Campinas e da Academia Iberoamericana de Derecho de la Familia y de las Personas. Detentor de prêmios em concursos de monografias jurídicas e de crônicas literárias. Conferencista e autor de livros publicados no Brasil e no Exterior e de artigos científicos em revistas especializadas. Membro Honorário da Academia de Letras da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Titular da cadeira nº30 da Academia Campinense de Letras. E-mail: agfernandes@tjsp.jus.br Publicado no Portal da Família em 25/10/2010 |
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