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Atenção - Ohs !

A época das discussões e das hipóteses e conjeturas pouco convincentes já passou. Atualmente tem-se como certo que no planeta Sigma 3, em tempos longínquos, existiu uma civilização altamente desenvolvida. Os antepassados dos selvagens habitantes de Sigma 3 sabiam de tudo aquilo que só será novamente conhecido neste planeta após muitos milênios.

Não se descobriu a razão que levou os antigos sigmianos a guardarem todos os documentos históricos (e até jornais) em cápsulas herméticas de aço inoxidável, enterrando-as profundamente no solo.

Mas, assim que encontramos tais cápsulas, encerraram-se as discussões e nos foi revelada a incrível história do desenvolvimento e da queda da civilização em Sigma 3.

Sempre se supôs que uma repentina degradação da sociedade era invariavelmente antecedida por algum acontecimento trágico: uma catástrofe cósmica, um cataclismo geográfico (um dilúvio ou uma glaciação do planeta), ou finalmente uma guerra.
Em Sigma 3 não ocorreu nada disso.

Tudo começou num ridículo e insignificante processo jurídico. E se a demanda judicial do lado queixoso não fosse tão miserável e anedótica, nem o mais pobre jornaleco se dignaria a publicar mais de três linhas sobre o ocorrido.

Em suma, o caso era o seguinte:

Em Marktown, capital da Igrekênia, na rua das Rosas Azuis, existia já há muitos anos o Museu das Falsificações, único em seu gênero. No Museu estavam expostas somente imitações únicas de raríssimas obras da Antigüidade: dinheiro falso de todos os povos e épocas; falsas pedras preciosas que não se distinguiam das verdadeiras. E o principal: talentosas imitações de quadros dos grandes mestres da pintura.

Muitas das imitações, antes de acabarem indo para tão original Museu, tinham conseguido uma popularidade escandalosa.

A freqüência do Museu era sempre numerosa. Os visitantes gostavam de olhar para os quadros e para o dinheiro falso. Ouviam com prazer as explicações dos guias sobre os colecionadores habilmente enganados, ficavam assombrados com as quantias pagas pelos colecionadores para adquirirem as imitações e sentiam mais inveja da sorte dos falsificadores do que pena das vítimas destes engodos.

Já os especialistas visitavam o Museu para admirarem a habilidade com que foram imitadas tantas obras-primas, e mais uma vez convencer-se de que eles, como especialistas, sabem quando é uma verdadeira obra-prima e quando é uma imitação. E que enganá-los é impossível.

Aconteceu que um certo Dave Davis, rapaz totalmente desconhecido, acusou o Museu das Falsificações de, em vez da cópia do quadro Alimento dos Deuses da autoria de Shtrutzel Júnior, pintor mundialmente conhecido, expor a obra-prima original. Desta maneira, o Museu das Falsificações andava enganando os visitantes. Dave Davis exigiu que o Tribunal, em primeiro lugar, desmascarasse o indecoroso fato e, em segundo lugar, obrigasse o dono do Museu a indenizá-lo por perdas materiais. Mais exatamente: pagamento da entrada no Museu - três púficos (moeda corrente daquela época em Sigma 3), ida e volta de táxi ao Museu - seis púficos e perda da fé na honestidade - dez púficos. (Dave afirmou que por toda vida cultivou esta fé e por isso não poderia avaliar a sua perda por menos de dez púficos).

Para Louis Ellington, dono do Museu, não haveria problemas em devolver uns míseros púficos a este tal Davis. No entanto estava em jogo a reputação do Museu. E Ellington, absolutamente convicto de sua inocência, apareceu no Tribunal.

O juiz sugeriu ao requerente e ao acusado uma conciliação pacífica, o que foi refutado orgulhosamente por ambas as partes. Depois disso, o Tribunal pediu a presença dos peritos. Três especialistas examinaram minuciosamente o quadro exposto na sala do Tribunal e declararam que aquilo era uma verdadeira imitação. Ma o insistente Dave Davis não era da mesma opinião do três experts. Pediu ao Supremo Tribunal mais um exame do quadro, desta vez mais minucioso, e levado a efeito pelas maiores autoridades no assunto. As despesas, caso perdesse a causa, correriam por conta de Davis.

Desta vez os peritos trabalharam durante seis meses. Fizeram a análise química das tintas e do fundo, submeteram o quadro aos raios X, fotografaram e ampliaram cada centímetro quadrado da pintura, pesquisando o estilo do autor...

E assim, juntando os dados necessários, os melhores especialistas foram obrigados a reconhecer: o quadro era um original, de próprio punho do imortal Shtrutzel Júnior.
A verdade triunfava! Davis recebeu os seus dezenove púficos, e o perdedor, Louis Ellington, tornava-se dono uma raríssima obra-prima, a qual vendeu ali mesmo por 450 mil, o que diminuiu, em parte, o amargo sabor da derrota.

O processo transformou-se na sensação do momento. Os especialistas em Shtrutzel Júnior imploravam a Davis para que lhes explicasse a razão da sua certeza na originalidade do quadro. Jornalistas assediavam-no dia e noite. e ele prometeu-lhes revelar o aguardado segredo numa entrevista à imprensa.

Não obstante a entrevista ocorrer no mais amplo recinto de Marktown, o salão estava superlotado. Jornais e revistas de todo o Sigma 3 enviaram para lá seus correspondentes. A entrevista estava sendo transmitida pela televisão para todo o planeta.

- Como os senhores, provavelmente, já perceberam - começou Dave Davis - eu não processei o Museu das Falsificações só para receber do prezado Sr. Ellington os dezenove púficos. E se o Sr. Ellington ainda não se conformou com tal perda, peço-lhe que venha falar comigo e eu lhe devolverei esta quantia. - E aqui pela primeira vez ficou claro que Davis era bastante espirituoso e tinha um sorriso encantador. - Eu precisava deste pequeno processo jurídico somente para chamar a atenção para a minha humilde pessoa. Eu sou inventor. Conheço perfeitamente as dificuldades que um inventor desconhecido encontra para divulgar o seu invento. E, na verdade, não fosse este processo, dificilmente os senhores seriam enviados a esta entrevista, a qual, espero, me dará a promoção necessária (risos na sala). Então, primeiramente os senhores estão interessados em saber de que maneira eu constatei a originalidade do quadro. Respondo: com o auxílio de um aparelho de minha invenção, que eu chamei de óhmetro. - Com estas palavras, Davis tirou do bolso um objeto redondo, parecido com uma bússola e, de longe, mostrou-o aos presentes.

Os operadores de TV puseram o óhmetro em primeiro plano e os telespectadores viram em suas telas que o mostrador do óhmetro estava dividido em graus, junto aos quais havia alguns números. No centro do mostrador, um eixo com um ponteiro que girava livremente.

- O que é meu óhmetro e para que serve? Tentarei explicar. Cada um de nós pode ter notado que quando vermos uma verdadeira obra de arte, nós involuntariamente exclamamos Oh! com admiração. Este Oh! significa uma reduzida variação de "Oh! que lindo !", "Oh! como é maravilhoso!" ou "Oh! como é bárbaro!"

Por que fazemos tal exclamação? É que a obra influenciou-nos emocionalmente. Sim, toda obra carrega em si uma certa carga emocional. Como se sabe, teoricamente toda e qualquer carga pode ser medida. E este meu óhmetro serve para medir com precisão a quantidade de carga emocional.

A unidade de medição é o oh. Em algumas obras temos cem ohs, em outras, milhares, e ainda em outras não mais de dez.

É claro, nem todos os quadros de um determinado pintor têm o mesmo número de ohs. Mas, visitando todos os museus e exposições de Sigma 3 e tirando as medidas ohmétricas das obras dos mais proeminentes pintores, constatei que cada um tem uma faixa ohmétrica individual. Por exemplo, todas as pinturas de Trentel estão na faixa de 3.500 a 3.650 ohs, os quadros do genial Vaxdim Seidur ocupam a faixa entre 4.900 a 5.000 ohs, enquanto o Zaiguel-Zuiguel soma de 3.970 a 4.135, inclusive. E assim por diante...

Fazendo o seu trabalho o falsificador talentoso pode dominar completamente o traçado, os macetes e todas as particularidades do estilo do pintor, cuja obra procura copiar.

Mas é impossível reproduzir a força da carga emocional. Ela sempre será menor que a devida. Ou, em último caso, maior, se o falsificador é mais talentoso que o pintor cujas telas imita. Mas uma imitação, mesmo sendo melhor que o original, continua sendo uma imitação.

O avião é melhor e mais perfeito que um automóvel, mas não é um automóvel (risos na sala). Bem, voltemos a Shtrutzel Júnior. Eu sabia que a sua faixa emocional era de 3.770 - 3.850 ohs. Por isso, verificando que o quadro Alimento dos Deuses, no Museu das Falsificações, emitia 3.810 ohs, não duvidei nem por um instante que estava diante de um Shtrutzel original. E, como vêem, o óhmetro, não se enganou.

Quais os meus planos para o futuro? Estou certo de que, possuindo um óhmetro, todo museu e qualquer proprietário de coleção particular estará segurado contra a aquisição de falsificações. Portanto, os óhmetros podem ser vendidos. Não pretendo fabricá-los comercialmente. Simplesmente quero vender minha invenção a quem esteja interessado em explorá-la.

Com isso Davis encerrou sua apresentação e, em seguida, respondeu por duas horas às mais diversas perguntas dos jornalistas: como é feito o óhmetro, qual é a idade de Dave, com quem ele gostaria de se casar se se separasse da sua atual esposa: com uma loira ou uma morena.

Mas deixemos a entrevista. Não vamos descrever as negociações de Davis com as pessoas interessadas. Nem vamos determinar quanto ele recebeu pela sua invenção.

Os óhmetros foram postos à venda e a cada dia tornavam-se mais baratos.
Anotemos apenas que nas mais conhecidas galerias de arte e coleções particulares encontraram-se tantas imitações que o Museu de Falsificações logo perdeu sua originalidade.

Os sigmianos começaram a visitar as galerias de arte não para conhecer telas famosas, mas sim na esperança de descobrir mais uma imitação.

Os freqüentadores de museus, tomados de instinto caçador, pararam de olhar para os quadros, verificando somente se as telas imortais estavam imitindo aquela quantidade de ohs, que deviam emitir conforme o catálogo.

Estes eram, poderia se dizer, anticaçadores de tesouros. E a descoberta de um original até então desconhecido, não trazia tanta alegria quanto à descoberta de uma falsificação.

Todas as obras de arte significativas foram medidas e um homem culto de Sigma 3 precisava saber somente que a Madonna de Marinelli era a de 6.500 ohs e as famosas paisagens de Flauers tinham 3.400 (em média). E dos estudantes de arte eram exigidos nos exames somente estes conhecimentos exatos. E quando se falava em arte, não surgiam na memória imagens, associações ou pensamentos, mais sim números, números e números...

Em pouco tempo, encontrou-se um meio de medir as cargas emocionais nas obras musicais e literárias. Percebeu-se, então, que com obras literárias o caso não era tão simples. Em muitos romances e poemas famosos não se conseguia medir a quantidade de ohs, ou podiam ser medidos somente por óhmetros especiais ultrasensíveis.

No entanto, a técnica superdesenvolvida conseguiu sobrepujar estas dificuldades. Foram criados aparelhos especiais que captavam décimas, centésimas e até milionésimas partes de ohs. Como resultado, as obras literárias foram medidas e catalogadas da mesma maneira, como todas as outras.

Em Sigma 3 gostava-se de números e acreditava-se que tudo poderia ser analisado matematicamente. Passaram a dizer depois de algum tempo: "Eu posso ser analisado, portanto existo". E tudo o que não se podia expor em número, era encarado ceticamente e com desconfiança.

Foi talvez por isso que em Sigma 3 se difundiram tanto os óhmetros. A medição ohmétrica, deu, finalmente, possibilidade de usar critérios exatos de avaliação aos estudiosos de arte e literatura. Tão exatos eram os critérios que não houve mais necessidade dos especialistas. Pois qualquer um podia, com seu óhmetro, determinar quanto ohs havia nesta ou naquela obra.

Tudo caminhava normalmente. Mas, após alguns anos, surgiu uma nova tendência: começou com os romancistas e, em seguida, absorveu todos os tipos de literatura e arte.

Um certo autor, Iohann Damm, cujos romances emitiam de oito a dez ohs, declarou que escrevia conscientemente obras de baixo oh-padrão. E fazia isso porque ao leitor seria mais fácil assimilar romances de dez ohs, do que um de cem ohs. Por conseguinte, os romances de baixo oh-padrão seriam mais úteis. E um verdadeiro escritor devia preocupar-se, em primeiro lugar, se as suas obras eram úteis ou não.

Surgiu a discussão. Mas, aos poucos, mais e mais literatos e artistas começaram a concordar que quanto menos ohs tinha uma obra, mais facilmente ela seria vendida e assimilada. E os médicos psiquiatras, que substituíram os críticos de Sigma 3, confirmaram que (como demonstraram numerosas experiências) do ponto de vista médico, era melhor para o organismo não assimilar energia emocional de uma vez só; mas em pequenas porções-quanta. E as obras de baixo oh-padrão satisfaziam inteiramente a estas necessidades.

Assim, em Sigma 3 surgiu a quanta-literatura. Os literatos esforçavam-se em escrever pior, mas em grandes quantidades.

A criação de obras densas começou a ser considerada sinal de fraqueza literária e indiferença à saúde dos leitores.

E os que insistiam em não querer aprender a escrever mal, simplesmente paravam de ser lidos. Quem gostaria de minar a própria saúde?

Quase ao mesmo tempo em que aparecia a quanta-literatura, surgiram a quanta-música e a quanta-pintura.

E ninguém se preocupava com o destino da civilização de Sigma 3. Por que se preocupar, se a ciência e a técnica faziam enormes progressos? Parecia que nada lhes era impossível.

E quando Bidi Baridl, farmacêutico de província, teve aquela idéia tão sedutora quanto irrealizável, a onipotente ciência ajudou-o a realizá-la.

Bidi Baridl raciocinava assim. A literatura e a arte dão ao homem determinada sensação de bem-estar. Mas para ler um livro deve-se gastar muitas horas. Um filme toma duas horas. E até para ouvir uma sinfonia qualquer, gasta-se uma hora inteira.

Mas, pelo jeito, o homem tem necessidade destes ohs, já que perde tanto tempo para obtê-los.

Será que haveria um meio de suprir o consumidor com os ohs necessários, não em forma de livros, filmes e música, mas de maneira diferente? Por exemplo, em forma de comprimidos de ohspirina. Assim, em vez de assistir durante duas horas um filme com força de trinta ohs, toma-se um comprimido de ohspirina de mesma quantidade e, recebendo uma carga emocional idêntica à do filme, economiza-se tempo, que é dinheiro.

Mais ainda, na fórmula dos comprimidos de ohspirina conseguiu-se , além dos ohs, incluir certos ingredientes que, influenciando o psiquismo, obrigariam a pessoa que tomasse a pílula a ter os mesmos sentimentos que teria se assistisse a este ou àquele filme, ouvisse esta ou aquela obra musical, etc.

Neste caso, cada tipo de comprimido poderia ter o nome da obra que substituisse. Por exemplo, o comprimido de aventuras Torzon ou ainda, comprimido-comédia Boa Noite, Meu Bem.

Os comprimidos de ohspirina conteriam mais ou menos ohs, podendo ser em tom maior ou menor, compostos com a mistura de uma leve tristeza ou, pelo contrário, com gosto de felicidade.

Esta era a idéia do farmacêutico Bidl Baridl. Ele não sabia como se podia conseguir ohs em laboratório. Só sabia que as ohspirinas poderiam dar bons lucros. E, repito, apesar das dificuldades, a ohspirina, infelizmente, foi descoberta, fabricada e recebeu uma grande divulgação.

Maiores progressos foram alcançados pelos sigmianos na confecção dos comprimidos musicais. Após os primeiros e primitivos comprimidos que provocaram somente um estado de espírito alegre ou triste, surgiram comprimidos de maior complexidade. As pequenas drágeas de ohspirina compunham-se de várias e diferentes camadas emocionais. As camadas externas derretiam, eram absorvidas e, em conseqüência propiciavam determinado efeito mais rapidamente enquanto as internas o faziam mais devagar. E isso ensejou a possibilidade de compor inclusive comprimidos-sinfonia de quatro partes. A primeira camada (alegro) ao derreter provocava uma sensação de leveza, tranqüilidade. A segunda camada (andante) induzia a lentas divagações líricas. A terceira (vivace) novamente devolvia a um estado de espírito animado e, finalmente, a quarta fazia com que a pessoa sentisse uma imensa alegria e fé no triunfo do Bem, o que correspondia ao final otimista do comprimido sinfônico.

Tornou-se normal a cooperação criativa entre compositores e os fabricantes dos comprimidos. E cada vez mais freqüentemente, as novas obras musicais eram postas à venda. Com o tempo, os compositores aprenderam as receitas dos comprimidos musicais e começaram a compor suas obras diretamente, em forma de pílulas, eliminando o desnecessário processo de escrever a música. E não raro via-se no Jardim Público, como jovens apaixonados escolhendo uma alameda mais escura e engolindo um concerto para piano e orquestra qualquer, sentavam-se e abraçados, digeriam com exaltação a inspirada música.

Todos usavam a ohspirina.
Apareceram alguns que gostavam de tomar os comprimidos musicais juntos com os de pintura e literatura.

Apareceram também médicos charlatães, que recomendavam tomar as ohspirinas antes das refeições, porque isso não só ajudaria a digestão, como previniria a radiculite.

Surgiu inclusive um proeminente cientista, que descobriu que adicionando regularmente à ração das vacas comprimidos musicais, estas produziriam leite em dobro. E quando o novo método não funcionou, o cientista declarou que a sua idéia estava certa e a culpa não era sua e sim dos compositores que não estavam escrevendo as músicas necessárias às vacas.

Deve-se frizar que os acontecimentos aqui expostos não se passaram em dez ou quinze anos. Desde a invenção do óhmetro até o surgimento da ohspirina, em Sigma 3 tinham-se passado duas gerações. E depois passaram mais três gerações. E os habitantes do planeta lembravam já com dificuldade que antigamente existia a música e não drágeas musicais, literatura e não ohspirina literária.

Os sigmianos praticamente pararam de conversar e trocar idéias, porque suas bocas estavam constantemente ocupadas pelos comprimidos e já não havia idéias para trocar.
O papel predominante era o do estômago, onde eram digeridos os comprimidos de ohspirina.

Em seguida, a julgar por tudo isso, deveria haver a completa extinção dos, outrora, seres racionais.

Mas isto não aconteceu por uma simples razão, que deveria ter sido prevista. Os decadentes sigmianos foram salvos da completa extinção pela própria decadência. E isto não é um paradoxo! Somente graças à decadência, eles perderam o segredo de fabricação da ohspirina. Mas com isso esqueceram também tudo o que sabiam e conheciam.

Os selvagens sigmianos, livrando-se da ohspirina, começaram a voltar a si após centenas de anos.
Passaram-se séculos... E em determinado momento um habitante das cavernas rabiscou na parede encardida algo parecido com um caçador.
Seus vizinhos de caverna soltaram um Oh! de admiração.

Numa outra caverna, outra selvagem incompreensivelmente imaginou uma lenda sobre o guerreiro chamado Li.
Ao ser narrada, os primeiros ouvintes exclamaram Oh! e pediram bis.

Depois, os sigmianos aprenderam a confeccionar armas de bronze. E, não se sabe por que, gostavam de enfeitá-las com arabescos. Arabescos totalmente desnecessários que não davam maior resistência ao escudo nem deixavam a espada mais afiada.
Sim, os habitantes de Sigma 3 seguiam devagar, mas sempre, a estreita trilha do progresso.

A trilha começou a alargar, a alargar, até transformar-se numa espaçosa estrada que se perdia ao longe...

Um dia eles novamente aprenderão tudo o que sabiam antes. E descobrirão que há muito tempo atrás em Sigma 3 existiu uma elevada civilização. Os seus sábios tentarão adivinhar a razão do desaparecimento desta civilização e formular as mais ousadas e absurdas hipóteses.

Uns dirão que a civilização foi dizimada por uma catástrofe cósmica. Outros conjeturarão que se afogou no dilúvio ou foi apagada da face da terra pela geleiras.

Ninguém poderá sequer supor que esta civilização, grandiosa e imponente, foi arruinada por uns míseros ohs.
E eu, remexendo os documentos históricos penso: devo ou não, daqui a uns mil anos, contar a verdade ao povo sigmiano ?

Não, acho que devo. Tudo poderia acontecer novamente. E não se pode confiar que a decadência iria salvá-los outra vez.



Fonte: Conto do livro Os Robniks, de Vladen Bakhnov

 





Um conto de ficção bem-humorado, que nos faz refletir sobre nossa sociedade atual. Qualquer semelhança não é mera coincidência!
Vale a pena ler !

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