Todos nós
ficamos estarrecidos com a notícia de que uma filha, meiga, bem
educada, bonita, sem problemas financeiros, viajada e falando três
idiomas planejou e participou do assassinato dos pais. Todos nós
gostaríamos de ter filhas com os predicados acima (e muitos de
nós estamos neste momento trabalhando para isso). O que nos aterroriza
é ver que aquilo que os pais da Suzane faziam, nós costumamos
fazer também: colocamos nossos filhos nas melhores escolas, freqüentamos
as reuniões de pais do colégio, os matriculamos em cursos
de idiomas, valorizamos o cuidado que eles tê! m com o corpo, levamos
eles ao exterior, damos presentes para recompensar as suas conquistas
(um carro novo por entrar na faculdade), enfim, fazemos de tudo para vê-los
felizes e preparados para a vida.
A pergunta que ronda as nossas cabeças é: O que houve de
errado? A resposta mais fácil é afirmar que "a garota
deve ser doida". Mas se você está dentro daqueles que
estão se satisfazendo com essa resposta, sinto dizer que você
está errado. Primeiro, não esqueça que a mãe
dela era psiquiatra e se tivesse detectado alguma patologia na filha ela
estaria em algum tipo de tratamento. Não, Suzane não é
doida, ela é, psiquiatricamente
falando, normal. Sabendo disso, o nosso temor fica mais patente. Você,
como pai, tem procurado fazer o que Marisia e Manfred faziam, os seus
filhos parecem normais, recebem educação esmerada, eles
não podem reclamar de muita coisa, tem vídeo-game, cd player,
os últimos lançamentos do conjunto que eles gostam, os games
mais "irados", celular com capinha colorida, etc., etc. Entretanto,
alguma coisa dentro de você ainda teima em dizer:
"- Mas isso é coisa que não acontece todos os dias,
Suzane é uma exceção, não é a regra".
Se você insiste em continuar pensando assim, continue assim e perderá
a oportunidade de ver isso como uma lição a aprender, como
um alerta a algum tipo de comportamento, atitude ou sinalização
de valor que você deverá mudar na sua família feliz.
Antes de mais nada, Suzane é um caso extremo sim, mas um caso extremo
de um tipo de comportamento que não pode mais ser chamado de "anormal"
ou "exceção". Existem outros jovens que, se não
chegaram a matar os pais, chegaram a praticar outros atos de violência
extrema. O índio Galdino foi uma dessas vítimas, o garçom
de Porto Seguro foi outra. As meninas da Barra da Tijuca que foram espancadas
na portaria do prédio por uma gangue da própria escola e
os diversos casos de agressão dos famosos "pit-boys",
também fazem parte de um padrão de
comportamento que a nossa sociedade tem presenciado cada vez com maior
freqüência. Todos esses jovens eram originários de famílias
como a minha (e como a sua). Nenhum deles era originário de favelas,
de minorias sociais, de classes marginalizadas. Eram "filhos da classe
média" (daí para cima).
Vamos encarar a realidade com coragem e maturidade. Estamos fazendo algo
de errado. Talvez você especificamente não. Mas nós,
como membros da sociedade, estamos deixando a nossa classe gerar estes
"monstros". Eles estão saindo de lares "normais"
como o da família Richtofen, como o meu e como o seu. Não
há mais tempo para desculpas infantis, temos que encarar a realidade
e tomar atitudes para que este cenário mude.
O psiquiatra que analisava na TV o comportamento da Suzane deixou uma
pista bastante clara. Ele disse: "os pais tem que aprender a EDUCAR
os filhos, não somente a criar os filhos."
Muitos de nós
pensamos que educar os filhos significa mandá-los para uma escola
de renome, e que lá eles farão o seu dever (afinal de contas,
não é para isso que você está pagando tão
caro?). Se você pensa assim, você está no rol de pais
que precisa repensar o seu papel. Escola dá instrução,
não educação. Educação se
aprende em casa. Passar uma educação aos filhos significa
muito mais do que dar um sermão cada vez que ele vem com uma anotação
por motivos disciplinares na escola. Significa você, pai, servir
de padrão de comportamento para ele, e aí, meu caro, a coisa
fica muito chata. Se você tem atitudes preconceituosas com as outras
classes sociais, você está colocando na cabeça do
seu filho que, por algum motivo, aquele índio ou aquele garçom
tinham uma vida menos valiosa que a sua, você vai precisar se policiar.
Se você costuma ganhar dinheiro de maneira, digamos, pouco convencional,
como espera que o seu filho aceite os padrões da sociedade para
ganhar dinheiro honradamente? Se você costuma ser intolerante no
trânsito, com pessoas menos favorecidas e chama o guarda que o multou
de "pobre diabo, não tem onde cair morto", como você
espera que o seu filho reaja quando alguém lhe pedir para deixar
o restaurante por estar fazendo algazarra? Ser padrão de comportamento
é muito chato, concordo, mas quem disse que ser pai era só
diversão e alegria? Responsabilidade às vezes pode ser um
fardo e você é responsável por aquilo que o seu filho
vai aceitar como certo ou errado. Ele pode até decidir pelo errado
futuramente, mas ele lembrará que esse não era o padrão
que ele via em casa.
Um outro fator que aparece constantemente nesses "filhos-problema"
é verificar nos pais um comportamento quase que obsessivo em "agradar"
os filhos. Alguém em algum mo! mento falou a imbecilidade de que
ser um bom pai significava agradar o filho o máximo que pudesse.
Se você também está dentre os que pensam assim, então
também tem algo importante para mudar.
Existe uma enorme
confusão nisso ai. É claro que todos nós gostaríamos
de ver os nossos filhos sempre sorrindo, alegres, contentes e o amor que
temos por eles nos faz procurar deixá-los em estado constante de
felicidade.
Acontece que
a vida não é assim fora de casa (aliás, nem é
assim dentro de casa). Viver não é sobre "tentar ser
agradado o tempo todo" , viver é muito mais do que isso. Viver
é sobre saber ceder, sobre saber receber um não, sobre saber
perder, sobre decepcionar-se, sobre frustrar-se, sobre perder um grande
amor, sobre agradar aos outros sobre conviver com as diferenças
e, é claro, sobre sorrir, sobre ser agradado, sobre divertir-se,
sobre receber um sim, sobre ter um grande amor, sobre dançar, sobre
cantar, sobre vencer, etc.
Uma pessoa madura é aquela que recebe com a mesma naturalidade
ambas as faces de uma mesma moeda: vitória e fracasso. Óbvio
que ficamos felizes com o sucesso, a expressão do nosso rosto denota
imediatamente alegria, mas ao nos depararmos com um fracasso, como reagimos?
Estamos preparados para isso? Se nós não estamos preparados
para isso, como vamos ensinar aos nossos filhos a lidarem com algo tão
natural na vida como são as derrotas, as decepções,
as tristezas?
Meu amigo, acredito firmemente que todos esses jovens que tomaram essas
atitudes violentas não foram preparados para lidar com negativas
às suas expectativas. Eles foram instruídos desde ternos
tempos que o mundo foi feito para eles serem vencedores sempre, que todos
têm a obrigação de agradá-los, que o certo
é os
outros se esforçarem para fazê-los felizes e, sabe como tudo
começou? Em casa mesmo, quando o seu mundo era basicamente seus
pais, eles faziam de tudo para agradá-lo e evitavam que ele sofresse
decepções, frustrações, traumas, stress. O
perigo desta atitude reside no fato de você, pai, não perceber
o mal que está
fazendo, até o momento em que você tem que tomar efetivamente
uma atitude que o desagrade (como ao descobrir que a filha anda namorando
um sem-vergonha). É ali que você vai perceber que o seu filho,
ou a sua filha, não foram preparados para lidar com negativas,
com limitações, com autoridade, com respeito e você
passará a ser o "errado", porque deixou de fazer aquilo
que você sempre fazia, que era agradar os desejos dos filhos. Como
será que aquela filha vai reagir? Depende da filha, umas vão
simplesmente mentir e continuar o namoro proibido, outras simplesmente
deixarão de ser carinhos! as com você, algumas deixarão
de falar com o pai, outras fugirão de casa e outras, em caso extremo,
planejarão a sua morte.
Acredito que muitos de vocês não gostem do que estão
lendo aqui, e sabem por quê? Porque coloca o problema bem dentro
do seu próprio lar. Não se trata de discutir um crime hediondo
cometido por uma doida, nem de uma assassina que assimilou a "inversão
de valores" da sociedade consumista. Trata-se aqui de discutir o
que havia de errado na família Richtofen e que pode haver também
na sua, na minha. O problema deixa de ser "virtual", distante,
lúdico e mais uma "loucura de fim do mundo" para ser
um problema que pode estar sendo "cozinhado" bem na sua casa.
Além disso, ser pai, pelo que está escrito aqui, é
complicado demais, dá trabalho demais.
Ter que ser exemplo de comportamento é chato e ensinar os nossos
filhos a lidarem com negativas, stress, fracassos, decepções
é muito mais trabalhoso e difícil do que simplesmente agradá-los
e dar aquilo que eles estão reivindicando... Afinal de contas,
temos condições para isso, não? Mas aí a escolha
é sua.
Qual o tipo
de pai que você vai escolher ser é um direito que você
tem. O pai que diz uma coisa, mas faz outra (e ainda repete com orgulho
"faça o que eu digo e não faça o que eu faço"),
ou o pai que mantém um comportamento coeren! te com aquilo que
ensina ao filho? O pai que ensina ao filho a lidar com frustrações,
negativas e derrotas (e como é trabalhoso isso!) ou o pai que resolve
da maneira rápida e "eficiente" deixando o seu filho
não passar por "traumas" e decepções provendo
aquilo que ele deseja o mais rápido possível?
Da sua decisão vai depender se a sua família vai gerar mais
jovens pit-boys e suzanes, ou se vai efetivamente ser uma família
feliz. Feliz de verdade, não como o vizinho dos Richtofen declarou:
"Parecia que era uma família feliz".
Fonte: contribuição recebida
via internet, com autor desconhecido.
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* Assassinato violento do engenheiro
Manfred von Richthofen e sua mulher, a psiquiatra Marísia, ocorrido
em São Paulo em novembro de 2002, planejado pela filha, Suzane,
de 19 anos, com o auxílio do namorado Daniel Cravinhos e do irmão
deste.
O caso, ainda em julgamento, chocou a opinião pública pois
a família não tinha problemas financeiros, a filha estudou
em um dos melhores colégios da cidade, falava 3 idiomas, era estudante
de direito numa boa faculdade, e seus pais, pelo que se sabe, eram preocupados
com o futuro dos filhos e procuravam estar presentes no dia-a-dia deles
(há um filho mais novo, Andreas). O motivo alegado foi a proibição
do namoro com Daniel, rapaz problemático. Os dois eram viciados
em maconha.
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